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MaximumRockandRoll - Os 30 anos da bíblia punk

A MaximumRockandRoll me foi apresentada por Fábio, vocalista da banda WCHC, numa madrugada qualquer dos anos 80. Enquanto fazia hora para entrar no Rainbow Bar, um pequeno clube underground no bairro do Jabaquara, folheava maravilhado o fanzine que, já naquela época, era tido e havido como "a" fonte de informações sobre a cena punk internacional.

Só fui botar as mãos em outra MRR em 1993, quando visitei uma lojinha punk de Milão chamada New Zabriskie Point. Comprei a edição do mês com o proprietário, Stiv Valli, ele próprio um importante fanzineiro italiano que foi matéria de capa da MaximumRockandRoll.

Quando voltei ao Brasil, resolvi imediatamente assinar a MRR. Ao longo dos anos, perdi a conta de quantas bandas conheci nas páginas do zine de San Francisco: Los Crudos, Man is the Bastard, New Bomb Turks, The Queers.

Mas o grande barato da Maximum nunca foi exatamente a crítica ou o jornalismo musical. A MRR, ao contrário do famoso e influente Flipside, seu equivalente de Los Angeles, sempre tratou o punk como uma subcultura com um código de ética rígido e sem concessões.

E a grande arena para o debate ideológico eram as páginas de colunistas. Por ali passaram escritores punk, donos de selos independentes, jornalistas, músicos e observadores do movimento. De Larry Livermore, da Lookout Records, a Ben Weasel, líder da popular banda Screeching Weasel. De Lefty Hooligan e seu pensamento leninista ao quase conservador Jeff Bale.


No centro de tudo estava o editor Tim Yohannan, uma das figuras mais complexas do punk americano. Mesmo com toda a influência conquistada pelo fanzine em décadas de atividade, Tim Yo jamais quis que a MRR deixasse de ser operada como um coletivo. Ele optou por manter um emprego no ambiente acadêmico e seu radicalismo levou à perda de conhecidos anunciantes, como a Alternative Tentacles, de Jello Biafra, que Tim alegava divulgar lançamentos de discos que não eram punks.

A personalidade difícil de Yohannan o fez colecionar muitos desafetos ao longo dos anos. Alguns "shitworkers" saíram para fundar seus próprios fanzines -como os influentes Punk Planet e HeartattaCk- e leitores famosos, como Billie Joe Armstrong, do Green Day, guardam rancor de décadas pelas críticas ácidas do patrono punk.

Entre 1999 e 2001, conheci dois famosos colunistas da MRR que passaram por São Paulo: o escritor Mykel Board e Dave Dictor, vocalista da lendária banda hardcore MDC. Board, que escreve para o fanzine desde o início dos 80's, afirma que Tim Yo era um dos únicos punks que jamais se venderiam. E as opiniões de Dictor reforçaram a reverência.

Por isso, quando Yohannan morreu de linfoma, em 1998, muito se especulou sobre o fim da MRR. Mas o fanzine permaneceu ativo graças ao esforço de uma nova geração de colaboradores e completa impressionantes 30 anos de atividade em 2012.

Fábio, do WCHC, morreu tragicamente em um atropelamento poucos anos depois de me apresentar a MRR. O Rainbow Bar não demorou muito para fechar as portas. Flipside, Punk Planet e HeartattaCk deixaram de ser publicadas. A New Zabriskie Point também não existe mais.

Mas a MaximumRockandRoll resiste ao tempo.

Rolling Stones: 50 anos em 5 regravações

Na semana em que completam 50 anos de carreira, daria para falar muito sobre os Rolling Stones. Inclusive, e principalmente, sobre o evento quase surreal que é manter uma banda de rock ativa por meio século.

Lembre-se: os Stones são contemporâneos dos Beatles e, seja como testemunhas ou como protagonistas, passaram por todas as metamorfoses musicais das últimas cinco décadas.

Poderia falar também sobre minhas lembranças de infância com os clipes de "Start Me Up" e "Emotional Rescue", da história bizarra de um amigo que salvou Mick Taylor de ser atropelado por um ônibus em São Paulo (sim, aconteceu!) ou defender a subestimada obra dos Stones nos anos 80. O assunto dá caldo.

Parece mais divertido, no entanto, medir a influência do songwriting de Jagger e Richards, os Glimmer Twins, na música pop. Se foram extremamente impactados pela música negra norteamericana, os ingleses devolveram a dose sendo regravados pelos principais baluartes da soul music - de Tina Turner a Marvin Gaye, de Otis Redding a Aretha Franklin.

Mas quanto mais estranhas e virulentas as regravações, melhor o resultado. Ao longo dos últimos 30 anos, o material dos Rolling Stones foi simplesmente virado do avesso.

Abaixo, uma pequena lista que resume 50 anos de carreira em 5 covers sensacionais:



Sympathy for the Devil

LAIBACH
(1990)
Dois anos antes de "coverizar" esse clássico dos Stones, a banda da antiga Iugoslávia -atual Slovenia- havia regravado integralmente o álbum "Let it Be", dos Beatles. O resultado aqui é tão incrível quanto: ritmos marciais sob uma ambientação de industrial music. O suíngue dos ingleses é transformado em gelo no Leste Europeu. De arrepiar.

Under My Thumb
MINISTRY
(2008)

O Social Distortion regravou "Under My Thumb" duas vezes em estúdio. A versão de 1996 é, provavelmente, a melhor gravação que existe dessa canção. Mas não a mais original. O velhaco Al Jourgensen misturou tecladinhos oitentistas com guitarras distorcidas e sua voz cavernosa para criar um hit que faria sucesso nas pistas de dança do inferno.


I'm Free

SOUP DRAGONS
(1990)
É a canção que fecha a versão inglesa do álbum "Out of Our Heads", de 1965. Na América, a faixa foi limada do LP, mas ganhou sobrevida em 1990, quando virou o hit solitário da banda britânica Soup Dragons. Transformada num pop dançante, com slide guitars, wah-wah, coral soul e uma incursão pelo raggamuffin. Ganhou as paradas e tocou até cansar nas rádios brasileiras. É a cara do início dos 90's.



(I Can't Get No) Satisfaction

DEVO
(1978)
Quem ouve a versão absolutamente genial do Devo para "Satisfaction" não poderia imaginar que no futuro o riif feérico de Keith Richards seria usurpado pela publicidade para vender todo tipo de porcaria. Mark Mothersbaugh, no auge, implode as convenções e transforma o clássico sessentista numa pérola da maluquice funk-new wave. Um dos melhores covers de qualquer coisa em qualquer época.



Honky Tonk Women
THE POGUES
(1988)
Canção escrita por Mick e Keef numa fazenda do Mato Grosso (!) em fins dos anos 60. Richards lembra que quando dava descarga no banheiro do lugar, dezenas de sapos pretos subiam boiando na água... O ambiente influenciou para que a música soasse como um country à la Hank Williams, mas mudou com os arranjos do recém-chegado Mick Taylor. A versão do Pogues, por sua vez, traz uma mistura do que eles sempre fizeram de melhor: irish folk com pegada punk. Na versão de estúdio, quem canta é o guitarrista Spider Stacy. Já naquela época, o lendário Shane MacGowan estava em condições lamentáveis para gravar.