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D.O.A. - um novo capítulo na epopéia punk

Amada por muitos, odiada por outros tantos, a balada "Under the Bridge", do Red Hot Chili Peppers, dominou as paradas entre 1991-92.

O sucesso da canção veio à reboque de um video-clipe dirigido pelo cultuado cineasta Gus Van Sant e exibido em alta rotação na MTV. No video, o vocalista Anthony Kiedis zanzava pelas ruas de Los Angeles usando uma camiseta do D.O.A.

A informação, quase subliminar para a massa que acendia isqueiros e outros artefatos ao som da lassidão dos Chili Peppers, não passou batida para quem sabia do retorno da banda punk canadense.

Explica-se: em 1992, quando "Under the Bridge" bombava, o D.O.A. retomava discretamente suas atividades após uma aposentadoria relâmpago.

Em 1990, a banda anunciou que iria se separar e, à convite do já falecido Dirk Dirksen, ex-road manager dos Doors e agitador cultural de San Francisco, realizou uma turnê de despedida que culminou com um show gravado e lançado no DVD The End. O show tem, inclusive, uma energética participação de Jello Biafra, que canta duas músicas do disco Last Scream of the Missing Neighbors -gravado em parceria com o D.O.A.-, entre as quais a sombria "Full Metal Jackoff", com seus 17 minutos de paranóia oitentista.

Naqueles tempos, eu assinava a Maximumrockandroll, o lendário fanzine punk de San Francisco, e me deparei com um curioso anúncio. O D.O.A. voltava à carga divulgando seu último lançamento, o disco 13 Flavours of Doom, mas, sutilmente, mandava o recado: "Queremos tocar na América do Sul!".

A surpresa era ainda maior porque, até aquela época, poucas bandas punks estrangeiras tinham tocado por aqui. Me ocorrem os caóticos shows de Ramones e Toy Dolls no fim dos 80's, com batalhas campais e pessoas esfaqueadas. E apenas na metade da década seguinte, três shows incendiários do Agnostic Front para 200 pessoas por noite no mitológico Black Jack Bar.

Houve outros, claro, mas eventos tão espaçados que podem ser mapeados pela memória. Já a desejada turnê sulamericana do D.O.A. nunca chegou a acontecer.

Mas os punks de Vancouver continuam vivos e bem. Pelo menos Joey Keithley. Desde 1992, lançaram nada menos que 8 álbuns de estúdio. Um dos últimos é Northern Avenger, de 2008, produzido por ninguém menos que Bob Rock, o homem por trás do multiplatinado black album do Metallica.

Foi Bob Rock, aliás, que cunhou o termo "northern avenger" (vingadora do norte) para se referir à lendária Gibson SG de Joey Shithead. O apelido pegou e virou o título do disco que, diga-se, é inspirado e muito bem produzido.

A indefectível voz de Shithead canta refrões que são um convite à baderna: de sacadas bem-humoradas ("Golden State") a temas recorrentes do ethos punk ("Police Brutality" e "This Machine Kills Fascists"), passando por reminiscências de uma vida no underground ("Still a Punk").

Para quem já leu a autobiografia de Joey -"I, Shithead: A Life in Punk"-, não é surpresa a inclusão de um reggae ("Poor Poor Boy") e uma regravação do Creedence Clearwater Revival ("Who Will Stop the Rain"). O canadense conta no livro como uma viagem à Jamaica, quando criança, o tornou um admirador do reggae original e porque, para ele, a folk music e o punk são "filosoficamente próximos".

O livro, aliás, traz dezenas de histórias imperdíveis, como, por exemplo, um encontro surreal com David Lee Roth, no auge do Van Halen, ou a revelação de que Kurt Cobain e Courtney Love teriam se conhecido num show do D.O.A...

Mas a boa notícia mesmo é que Northern Avenger, o disco, foi lançado no Brasil. E o selo Red Star quer, ainda por cima, materializar um antigo sonho do D.O.A. e trazer os caras para a América do Sul.

Joey Shithead já disse que topa.

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Atualização (30/08/11)
: turnê do D.O.A. no Brasil confirmada!

Apresentação em SP: 19/11/11
Local: Hangar 110
Com shows de Olho Seco e Agrotóxico
Ingressos: 1º lote: R$ 30,00; 2º lote: R$ 40,00; Porta: R$ 50,00

• Ingressos online através do Ticket Brasil: www.ticketbrasil.com.br
• Outras informações: (11) 3229-7442


D.O.A. bota pra quebrar em "Human Bomb", clipe promocional de Northern Avenger.


E aqui, a sensacional versão de 1982 para "War", hit original do soulman de Detroit Edwin Starr.

Uma entidade chamada Slayer

O metal underground dos anos 80 é imbatível. Inspirado pelo espírito de rebeldia e independência, implodiu as fórmulas criadas pelos veteranos do gênero e cunhou uma sonoridade radical e com mínimo potencial comercial.

Os protagonistas do thrash metal e seus subgêneros eram punks na essência: subiam ao palco com as camisetas e jeans surrados do dia-a-dia, falavam de bebedeiras, violência e questionavam a autoridade - seja da Igreja ou dos chefes de estado em tempos de Guerra Fria.

Num piscar de olhos, as estrelas do heavy metal de então pareciam velhas e ultrapassadas. A vitalidade e o poder de invenção do thrash também colocaram o hardcore numa encruzilhada. De um lado, os veteranos do metal britânico se refugiavam no odioso hair metal. De outro, alguns punks dissidentes aprendiam solos de guitarra e deixavam o cabelo crescer para criar o subgenênero batizado de crossover.

O tempo encarregou-se de absorver a influência estética e comportamental do thrash metal, um gênero essencialmente underground, e canonizar alguns de seus fundadores. A popularidade do Metallica engoliu metade da música pop nos primeiros anos da década de 90, enquanto Anthrax e Megadeth, cada qual à sua medida, vendiam milhões de discos.


Mas apenas o Slayer, formado desde sempre por um chileno, um cubano e dois americanos, reinou absoluto quando o thrash metal caiu no ostracismo.

O quarteto de Los Angeles, com seus riffs que pareciam içados das profundezas, sempre soou mais radical e extremo que seus pares mais famosos. Mas, em última análise, foi o fato de seus integrantes nunca se colocarem em situações públicas embaraçosas ou cobiçarem a aceitação pop que lhes trouxe a inabalável reputação.

Nos anos 90, o insano guitarrista Kerry King manter seus braceletes com pregos de 15 centímetros, enquanto o Metallica tocava alguma balada country, era quase um statement.

Comprei o disco de estreia do grupo -Show no Mercy- no início de 1986 na mitológica e hoje finada Woodstock Discos. Ouvir o álbum na íntegra modificou alguns padrões de percepção. E, no mesmo ano, esses padrões precisariam ser revistos com o lançamento da bomba atômica Reign in Blood, tocada em primeira mão, e na íntegra, pelo programa Rádio Corsário.

Desde então, o Slayer conquistou uma aura de importância próxima aos grandes dos anos 70. Deixou de ser uma banda comum e virou uma entidade.

Apesar dos temas pouco palatáveis e da violência sonora, o grupo expandiu sua influência para além do círculo fechado do metal. Foi regravado pela cantora pop Tori Amos, numa lúgubre interpretação de "Raining Blood", sampleado pelo Public Enemy, em um rap do épico It Takes a Nation of Millions to Hold us Back, virou tema popular no game Guitar Hero e cedeu músicas para diversos filmes.

Desfalcado momentaneamente do guitarrista Jeff Haneman, que contraiu uma doença bizarra que parece saída das próprias letras do grupo, o Slayer volta ao Brasil após 5 anos. Na próxima quarta, eles implodem o Master Arena, em Curitiba e, na quinta, devem lotar mais uma vez o Via Funchal.

Cumpra sua obrigação cívica e compareça.


Maturidade sem frescuras: em 1990, o Slayer lança o elaborado Seasons in the Abyss


Em 1985, o esporro juvenil de "The Antichrist" ajuda a demolir o heavy metal tradicional