ÚLTIMAS COLUNAS
Leia, comente, compartilhe

Viver e morrer com Warren Zevon

O anúncio da morte de Poly Styrene, na última segunda-feira, surpreendeu muitos fãs de música. A ex-vocalista da seminal banda punk britânica X-Ray Spex tinha 53 anos e havia descoberto câncer na mama há apenas 2 meses. Ela tinha um disco solo saindo do forno e sonhava em recuperar-se para interpretar o novo material no palco.

Mortes desse tipo são sempre dolorosas. Impossível não lembrar de outros artistas vitimados pelo câncer e que se agarraram à música até seus últimos dias. Frank Zappa foi consumido por um câncer de próstata e, nesse estado, conseguiu registrar seus últimos trabalhos, como Yellow Shark e o intrincado Civilization Phase III. Joey Ramone gravou seu álbum solo -sabiamente intitulado Don't Worry About Me- sabedor que a leucemia estava prestes a derrubá-lo.

O caso mais emblemático é possivelmente o do grande compositor e multiinstrumentista americano Warren Zevon. Com uma carreira que se estendeu do fim dos anos 60 até 2003, quando faleceu, também vítima de câncer, Zevon gravou 13 álbuns. Trovador da cepa de Tom Petty, o Senhor Mau Exemplo compôs, com a mesma propriedade, folk, rock'n'roll, country e até funk, como a ótima "Night Life in the Switching Yard", de 1978.

Warren é conhecido do grande público pelo hit quase solitário "Werewolves of London", do álbum Excitable Boy, ganhador de disco de platina na América. Era um letrista brilhante e dono de um irresistível humor negro. Melhor do que qualquer "Minuto de Sabedoria", Zevon parecia ter o talento natural para sintetizar em frases curtas e precisas qualquer situação da vida.

Como numa piada de péssimo gosto, mas que o próprio teria apreciado, não fosse ele o protagonista, dois anos após gravar o excelente Life'll Kill Ya, cujo tema central é a morte, Warren Zevon foi diagnosticado com câncer. Além da faixa-título auto-explicativa, o álbum trazia canções com nomes sugestivos como "Don't Let us Sick" e a pegajosa "My Shit's Fucked Up".

Zevon morreu apenas um ano após descobrir a doença. Nesse intervalo, gravou seu derradeiro registro: The Wind. Em seus últimos momentos, o cantor, que nasceu numa família de mórmons de Chicago, conseguiu acompanhar o nascimento dos netos e, apenas duas semanas antes de deixar o planeta, viu o disco The Wind chegar às lojas.

Mas sua despedida -absolutamente marcante- aconteceu no programa de Dave Letterman, onde teve a honraria de ser o único convidado. Falou por quase uma hora com o apresentador e tocou uma série de canções. Perguntado sobre o que havia aprendido com a doença terminal, fez jus à fama de criador de grandes aforismos e disse apenas: "Enjoy every sandwich" (Aproveite cada sanduíche).

A pedidos de Letterman, a última canção interpretada por Warren Zevon diante do público foi "Roland the Headless Thompson Gunner". Composta no período em que Zevon morou na Espanha, a música é um mini-épico de 3 minutos e meio sobre um mercenário norueguês que participa de guerras pela África. A letra foi inspirada em um encontro de Zevon com o proprietário de um bar que havia trabalhado, ele próprio, como mercenário pelo continente africano.

Ao final da canção, Warren assente timidamente e Letterman vai a seu encontro para encerrar o programa. O microfone deixa vazar o agradecimento do artista ("Thanks, Dave"), ao que o apresentador, visivelmente emocionado, responde apenas com um "Enjoy Every Sandwich".

Foi a última performance pública de Warren Zevon. Ele morreria menos de um ano depois em Los Angeles.



A vida imita a arte: Zevon, com pouco tempo de vida, interpreta a linda e ácida "My Shit's Fucked Up".


Aqui, a última canção tocada em público por Warren Zevon. De arrepiar.

Motörhead ao vivo: 1989 x 2011

Vi o Motörhead ao vivo em sua primeira turnê pelo Brasil no já mui distante ano de 1989. Os shows em São Paulo aconteceram no Ginásio do Ibirapuera.

À época, dada a ausência de casas de espetáculo particulares e com capacidade para abrigar um bom público, o Ginásio do Ibirapuera era bastante requisitado. Foi ali que também assisti -pela primeira e única vez- a um show do Metallica. Dois anos depois, em 1991, vi o The Cult na esteira do sucesso do disco Sonic Temple. E nunca mais voltei ao ginásio.

A verdade é que o lugar não foi projetado para shows musicais e a acústica era, para ser condescendente, bem meia-boca. Pior: na época, o público ainda era judiado pela ausência de um DJ minimamente preparado para esquentar o clima.

No show do Motörhead, a plateia teve de ouvir o álbum Back in Black, do AC/DC, na íntegra. Seria ótimo, se o disco não tivesse sido tocado pelo menos umas sete vezes seguidas. Ninguém aguentava mais.

As bandas de abertura, Viper e Vodu, representavam um tipo de heavy metal paulista feito na época. Eu não gostava de nenhum dos dois grupos, mas estava lá para ver Lemmy, naquele tempo já com 44 anos de idade - e todos se espantavam que ele ainda estivesse na ativa...

Achei uma resenha minha da época. Foi publicada em um fanzine carioca muito bem produzido, com capa em papel couché e tudo, chamado Revenge. Era o texto de um garoto de 17 para 18 anos, e ainda embasbacado com as descobertas do rock.

Não preciso recorrer à velha crítica de show para me lembrar que o Motörhead abriu a noite com "Dr. Rock", do ainda recente álbum Orgasmatron, gravado apenas 3 anos antes. O resto foi basicamente um desfile de pérolas da clássica formação Lemmy-Eddie-Taylor (e sim, o Animal tinha retornado e era o baterista naquela época). Abaixo, o set-list do show de 11 de março de 1989:
  1. Doctor Rock
  2. Stay Clean
  3. Traitor
  4. Metropolis
  5. Dogs
  6. I'm So Bad (Baby I Don't Care)
  7. Stone Deaf in the U.S.A.
  8. Built for Speed
  9. Just 'Cos You Got the Power
  10. Eat the Rich
  11. Orgasmatron
  12. Killed by Death
  13. Ace of Spades
Paguei ingresso para ver o show da arquibancada do ginásio, mas, convencido pela porralouquice dos amigos, fui pulando grades e mais grades até chegar na pista. A sensação de, ao mesmo tempo, burlar a lei e ver o show de perto, no meio do tipo de moshpit insano que acontecia na década de 80, foi incrível.

A noite seguinte foi uma zona. Não estive lá, mas ouvi relatos de quem esteve. Deu pau geral no sistema de som e o show foi interrompido após duas músicas. O público ficou furioso e Walcir Chalas, da Woodstock Discos, foi ao microfone acalmar a turba e avisar que a apresentação continuaria em outra data e local. O evento foi transferido para o já extinto Projeto SP, no bairro de Santa Cecília, lugar que acolheu shows de artistas como Iggy Pop e Stray Cats naquela mesma década.

O Motörhead andava em plena forma em 1989 e certamente quebrou tudo também no show (quase) extra. Mas o amadorismo das turnês internacionais, em comparação com a infraestrutura de hoje, era notável.

Fiquei quase 20 anos sem ver o Motörhead ao vivo. Quando esbarrei acidentalmente em Lemmy, nos EUA, contei pra ele só a parte boa -que estava lá em 1989- e tomei uma bronca: "Por que você não foi aos outros shows que fizemos lá depois?". Respondi que tinha estado em todos, mas que o primeiro é sempre especial. Lemmy foi gentil e concordou: "Eu entendo o que você quer dizer". Mas a verdade é que nunca mais tinha visto a banda ao vivo e, em minha memória afetiva, tudo que podia lembrar era da multidão no Ibirapuera e as explosões pirotécnicas seguidas de "Dr. Rock".

Revi o Motörhead apenas em 2007. Depois em 2009. E mais uma vez no sábado passado, dia 16/04/2011. Os set-lists não são mais surpresa -embora o deste ano até tenha sido, ainda que não necessariamente uma boa supresa- e a presença de palco é quase holográfica. Lemmy é uma lenda viva e sua presença tem algo de irreal.

Talvez seja a (minha) idade, mas o volume absurdo que a banda impõe a seus shows não me impressiona. Ao contrário, contribui para uma leve fadiga auditiva.

Não acho justo, por outro lado, esperar algo mais de Lemmy e companhia. Eles são o que são e, só o fato de estarem na ativa, em 2011, gravando e excursionando, é motivo de satisfação. Até alguns discos recentes -confesso que tenho ouvido poucos- são bem palatáveis. Inferno, de 2002, tem um punhado de faixas legais.

Mais do que isso: Lemmy está quase na moda. Estrelou comercial de cerveja, é o astro do clipe novo do Foo Fighters, o documentário sobre sua vida acabou de estrear e o Motörhead vai até tocar no Rock in Rio. Não é pouco.

Mas na minha imaginação, gostaria de ver o Motörhead tocar um disco como Ace of Spades ou Another Perfect Day na íntegra, este último de preferência com Brian Robertson na guitarra e Animal Taylor na bateria. Seria revigorante e nostálgico ao mesmo tempo.

Mas você sabe, se o Motörhead voltar em 2013, e deve voltar, estarei por lá. Todos estaremos. Como aquele filme que já assistimos 20 vezes, mas que não conseguimos largar quando passa em algum canal de TV.

Em tempo: assinei uma resenha completa do show e que deve estar publicada em algum lugar do Portal Rock Press. Procure por lá.


No meu show imaginário, Lemmy chamaria de volta Brian "Robbo" Robertson e Phil "Animal" Taylor para tocar Another Perfect Day na íntegra.

E o seu show imaginário do Motörhead, como seria?

Los Straitjackets e a surf music demolidora

O Motörhead toca amanhã no Via Funchal. Horas depois, em plena madrugada, o Misfits se apresenta no centro de São Paulo pela Virada Cultural. O mitológico Skatalites também está no Brasil. E, no domingo, tem show do D.R.I, banda que ajudou a arquitetar o gênero crossover.

Em meio a tudo isso, está passando levemente despercebida a vinda do seminal Los Straitjackets ao país.

O quarteto de Nashville também está escalado como uma das atrações da Virada Cultural e toca no próximo domingo, às 15h00, no Largo do Arouche. Show imperdível.

Los Straitjackets é citado com a mais cultuada banda de surf music em atividade, mas sua música vai além dessa convenção.

Veículo para o incrível guitarrista Eddie Angel, os Straitjackets passeam por gêneros como swing, rock'a'billy, garage e todo o espectro de som instrumental retrô. E como parece regra no revival surf, têm muito senso de humor: se apresentam sempre com bizarras máscaras de "lucha libre" mexicana.
Entre as fórmulas musicais congeladas no tempo, a surf music é aquela pela qual tenho mais simpatia. As bandas que ganharam notoriedade na esteira do sucesso de "Pulp Fiction", cuja trilha sonora ressuscitou a carreira do rei Dick Dale, foram espertas o suficiente para revisitarem o estilo com irreverência e identidade próprias.

O californiano Phantom Surfers, por exemplo, adotou o visual smoking & máscara, abusando de títulos sacanas para seus discos, como: "The Exciting Sounds Of Model Road Racing" e o ótimo "Skaterhater". E, musicalmente, são bastante competentes em recriar à sua maneira, e com algum teor de escracho, o som que embalava as festinhas da Califórnia nos anos 60.

A banda tocou no popular festival B.A. Stomp, em Buenos Aires, nos anos 90, e um amigo próximo teve a incumbência de hospedar e ciceronear um dos Phantom Surfers numa rápida passagem por São Paulo. O grupo, porém, não chegou a se apresentar por aqui.

Mas um de seus contemporâneos, ao contrário, foi protagonista de shows antológicos no Brasil durante a década de 90. Man or Astro-man?, a banda space-surf do Alabama, se apresentou por aqui algumas vezes e, em São Paulo, chegou fazer dois sets num mesmo dia, tal a demanda de público.

Vi duas apresentações do Man or Astro-Man?, ambas absolutamente incendiárias. A primeira, memorável, na casa de shows Broadway (atual Eazy) e a segunda, no Sesc Pompéia, quando tocaram ao lado do também americano Trans-Am que, literalmente, quebrou tudo.

O Man or Astro-Man? é como um filho bastardo de Dick Dale com Mark Mothersbaugh, do Devo. Tocam uma surf music envenenada, com um repertório quase que integralmente instrumental, e uma viagem retrô-espacial com direito a trajes de astroanauta e projeções de vídeos que parecem saídos de algum arquivo da NASA dos anos 60.

O último disco do Man or Astro-Man?,"A spectrum of Infinite scale", expandiu sua música para uma fronteira mais experimental, com direito à uma faixa com título em português: "Um espectro sem escala".

Mas nada como ter testemunhado o rei da surf guitar ao vivo e a cores. Em 1996, Dick Dale, que então excursionava pelo mundo com uma carreira revigorada pelo uso da bombástica "Misirlou", de 1962, na abertura de "Pulp Fiction", esteve no Brasil para uma série de shows.

Tocou no hoje extinto Olympia, na mesma noite em que o Fugazi atordoava o público com um set radical na Broadway. O conflito de datas foi contornado. Assisti ao Fugazi e, dias depois, me mandei para Santos ver Dick Dale tocar numa discoteca chamada Twister.

À época com um power-trio turbinado, Dale, um dos revolucionários da guitarra elétrica, triturou sua Fender diante de 300 afortunados. Assisti ao show a um metro do palco e vi as palhetas literalmente virarem pó com a famosa palhetada de Dale que faz Scott Ian e James Hetfield parecerem guitarristas de alguma bandinha de igreja.

No próximo domingo, há outra oportunidade imperdível de assistir a um impactante set de surf music. Não espero nada menos que uma performance demolidora dos Straitjackets.

Se eu fosse você, não perderia por nada.


Acima, Los Straitjackets no vídeo da sensacional "Tempest".


E aqui, o clipe de "Nitro", uma pequena amostra do poder de Dick Dale quando retomava sua carreira nos anos 90.

Misfits e Danzig no Brasil

No próximo fim de semana, o Misfits se apresenta em São Paulo como parte da Virada Cultural.

Exatos três meses depois, em 16 de julho, será a vez de Danzig, a auto-indulgente banda de seu vocalista original, retornar ao país. A primeira e última apresentação do grupo por aqui aconteceu em 1995.

Danzig e o Misfits são bem melhores juntos que separados.

A obra escrita por eles entre 1977 e 1983 é algo do melhor no punk rock. Com elementos emprestados de Alice Cooper, Ed Wood, Elvis Presley e Bela Lugosi, o Misfits criou seu próprio universo de terror barato, rebeldia adolescente e três acordes.

Diferente de todas as outras bandas punk de sua geração, e tremendamente influente para as que vieram depois, o Misfits gravou pouco, saiu de cena e entrou para a antologia do gênero.

Porém, em 1996, após um longo imbróglio judicial, a banda voltou às atividades. Musicalmente, o retorno foi pouco inspirado e seguido por uma encarnação completamente picareta.

Enquanto isso, Glenn Danzig lançou o Samhain -uma extensão do Misfits com uma sonoridade, digamos assim, mais lúgubre- e teve momento de popularidade nos anos 90 com a exibição frequente do video-clipe de "Mother", um hit que, por algum tempo, o colocou em algum lugar entre o underground e o mainstream.

Me lembro de ouvir o spot promocional do show de Danzig, no já extinto Olympia, há 16 anos. Por uma razão ou outra, acabei perdendo.

Mas estive na primeira visita do Misfits ao Brasil e posso garantir que, pelo menos em 1998, a nostalgia funcionava. Na ocasião, ainda sob o impacto de sua recente volta e tocando para um público que jamais os tinha visto ao vivo, o Misfits convenceu.

Com os irmãos Doyle de um lado e Jerry Only de outro, a banda preservava algo do carisma e teatralidade originais, ainda que eu não faça ideia de quem tenha cantado com eles naquela noite.

O restante público também não se importou e cantou junto em alguns clássicos de escracho adolescente como "Last Caress" e "Teenagers from Mars".

Desde então, a banda se perdeu em projetos esquisitos, line-ups irreconhecíveis e até uma versão baile da saudade com Marky Ramone, em que assassinavam clássicos de Misfits e Ramones para plateias órfãs de Joey e Dee Dee. Uma vergonha.

Com essa formação, lotaram a tradicional casa de shows Palace (Citibank Hall), em São Paulo. Depois, já sem Marky, o truque não deu certo e tiveram um show cancelado, de véspera, sob a mirabolante alegação que Only estaria sofrendo com os efeitos de uma vacina contra febre amarela recebida em algum país sulamericano.


Em 2011, Danzig e o Misfits permanecem separados naquele que é um dos reencontros mais aguardados e improváveis do rock.

Talvez o Misfits não se aposente porque Only mantenha consigo o prazer de subir ao palco, mas também, e principalmente, porque trata-se de uma grande marca. Qualquer peça de merchandising que leve a estampa do mascote Crimson Ghost tem chance de ser um sucesso. A figura é tão emblemática que tornou-se um ícone pop e pode ser vista em filmes e camisetas de celebridades. Com a banda na ativa, esse efeito é apenas potencializado.

Em 2004, tive a oportunidade de entrevistar Jerry Only e o próprio me confidenciou que a banda é integralmente financiada por merchandising - uma espécie de Kiss do underground (leia a entrevista na íntegra aqui).

Danzig, por sua vez, sumiu dos holofotes. E, acreditem, o cara já foi popular. Em 1994, excursionou com o Metallica, para quem cantava 3 músicas todas as noites. Teve ainda uma de suas canções -"Thirteen"- regravada com extrema beleza por ninguém menos que Johnny Cash. Fundou uma editora de quadrinhos e tem uma fanbase adolescente que consome vorazmente seus produtos.

Mas Glenn, em seu mundo paralelo de hedonismo e feitiçaria de boutique, tornou-se um personagem irreal no nível de Chuck Norris. Suas histórias de excentricidade geram "facts" que povoam a imaginação de fãs de rock. Em foruns pela internet, é possível encontrar discussões hilárias como: "O que Danzig estaria fazendo nesse momento?", "Como Danzig agiria nessa situação?", etc. Virou personagem.

Em sua imperdível série "Metal Real Estate" ("As propriedades dos metaleiros"), o divertidíssimo site americano Metal Inquisition publicou fotos e opiniões sobre a residência de Glenn Danzig. A casa tem uma antena old school no telhado, uma parede inacabada de tijolos no jardim e ervas daninhas crescendo por toda parte.

Para o bem ou para o mal, Misfits e Danzig, mesmo separados, certamente vão divertir o público brasileiro.


Acima, o Misfits em uma performance explosiva com seu line-up clássico.


Danzig-personagem: uma das montagens mais engraçadas da internet. Aqui, um (bom) cover de Glenn Danzig faz um dueto bizarro com a colombiana Shakira. Repare no surrealismo da letra.

Voivod - o show que você não viu

Há seis meses -mais precisamente em setembro de 2010-, a banda canadense Voivod viria ao Brasil pela primeira vez em 25 anos de carreira.

Ainda que tenha perdido o sensacional guitarrista Dennis "Piggy" D'Amour em 2005, vítima de câncer, a banda optou por seguir na estrada. Recrutaram um substituto para a complexa tarefa e ainda contaram com o retorno em boa hora de Jean-Yves Theriault, o Blacky, baixista original, afastado desde 1990, que gravou quase todos os discos essenciais do Voivod.

Com 3/4 de seu line-up original, a banda tem viajado pelo mundo e tocado, na maioria das vezes, ao lado de outros veteranos da cena thrash dos anos 80. Não era exatamente o futuro que eu imaginava para o Voivod, mas, para eles, o gueto do metal é certamente um porto seguro.

O Brasil quase fez parte dessas andanças do Voivod pelo planeta. A apresentação foi cancelada em cima da hora e nossa entrevista pré-agendada com a banda também foi para o vinagre.

O motivo apresentado pela produtora é que os músicos não teriam obtido seus vistos de trabalho em tempo hábil. O show seria, então, remarcado para o início de 2011.

A versão extra-oficial dá conta de que o real motivo para o cancelamento teria sido a baixa procura antecipada por ingressos.

Seja qual for a verdade, o Voivod esteve, sim, na América do Sul no início de 2011. Na verdade, eles andaram por aqui há menos de 2 semanas, mas, no vácuo dos megashows de Iron Maiden e Ozzy Osbourne, a apresentação dos canadenses em Santiago do Chile mal reverberou no Brasil.


A experiência de ver o Voivod ao vivo em 2011 seria uma nostalgia do futuro. O quarteto de Quebec sempre esteve à frente de seus pares no quesito inovação. A cada novo disco, uma proposta musical mais avançada e complexa.

A banda nunca escreveu sobre bobagens satanistas, dragões ou mitologia. E também não me lembro de terem exaltado o "estilo de vida headbanger" em suas letras. A praia do Voivod sempre foi o hiper-espaço, a tecnologia controlando a espécie humana, os alienígenas espiando pela janela ou alguma autocracia num mundo imaginário. E a música sempre acompanhou essa onda.

Piggy tornou-se um ourives das dissonâncias, dos riffs intrincados e solos de guitarras lindamente tortos. E Snake deixou de gritar, tornando-se, cada vez mais, um cantor de fato.

O conceito em volta da banda era claramente a obra de artistas, coisa rara no metal. Em 1989, o baterista e designer Away criou a arte para a capa do clássico "Nothingface" em computador. É isso aí, ilustração digital em 1989. Modernidade sempre foi com esses caras.

A cultura musical do Voivod veio da inspiração causada por gente como Venom, Discharge e Motörhead, mas sua imaginação passeou pelas obras de King Crimson e Pink Floyd (de quem fizeram dois covers extraordinários), materializando essa complexa teia de referências num disco pouco compreendido e de surpreendente sensibilidade pop chamado "Angel Rat".

A disposição de expandir sua atuação para além dos clichês do thrash metal criou uma aura de culto ao redor da banda. Jello Biafra escreveu sobre isso no prefácio de "Worlds Away: Voivod and the Art of Michel Langevin".

E o ex-líder dos Dead Kennedys não é o único célebre fã fora da tribo metal. Kim Thayil (Soundgarden) e Matt Cameron (Pearl Jam) são outros admiradores confessos do Voivod.

Dave Grohl, que dispensa apresentações, vai ainda mais longe. É possível assistir no YouTube a uma entrevista em que ele dedica quase 20 minutos (!) para esmiuçar a discografia, os solos de guitarra e as letras do Voivod.

Uma rápida visita ao Chile para ver esses lendários canadenses teria sido uma saudável loucura.



Acima, uma pequena amostra do Voivod, ao vivo e em alto astral, em Santiago, executando a colossal "Tribal Convictions".